De
Ulisses Lins de Albuquerque
Livro Moxotó Brabo
Livro Moxotó Brabo
Organizações Simões
1960
1960
José Joaquim de Siqueira, filho de Manoel Alves de Oliveira Melo e de Maria do Ó de Siqueira – esta filha do Mestre de Campo Pantaleão de Siqueira Barbosa -, morava em Custódia, fazenda onde o pai levantara uma capela sob a invocação de São José, e que naqueles tempos – 1830, mais ou menos – era o começo de uma povoação.
Muito moço, casara-se com a irmã de um padre, enviuvando anos depois. Não houve filhos do casal.
Mas nas suas aventuras, José Joaquim era pai de alguns filhos naturais, dentre estes um mulato conhecido pela alcunha de Caipora e uma mocinha, que era a menina dos seus olhos – fruto de suas aventuras de rapaz descontrolado, com uma parenta do Piutá.
Um moço pedira-a em casamento, e tudo já estava bem encaminhado para a realização do ato, quando o noivo resolveu dar o dito por não dito. É que o pai havia sido assassinado lá para as bandas de Sororoca, nas imediações de Pesqueira, onde residiam uns parentes de José Joaquim, e havia suspeitas de que este participara do atentado: apontavam-no como mandante do crime, atribuindo-se o fato a certas divergências havidas há algum tempo entre ele e a vítima. Assim, tomando conhecimento do que os parentes lhe diziam, o rapaz resolveu desfazer o contrato de casamento.
Mas José Joaquim, valentão e desabusado (especialmente quando tomava um trago), mandou dizer-lhe que, naquela altura, não podia admitir a ruptura do noivado; e assim, que ele escolhesse: “Ou casava com a menina, ou casava com José Joaquim de Siqueira” ...
E o certo é que o casamento se realizou.
Naqueles tempos – 1840 ou alguns anos depois – O Governo Provincial ordenara forte perseguição ao célebre cangaceiro Luís Manuel Frazão, autor de umas mortes na vila de Flores, e que, com um grupo, andava em correrias pelas freguesias vizinhas.
O coronel Francisco Barbosa Nogueira Paes, chefe político liberal em Flores, e dois outros chefes sertanejos – Serafim de Souza Ferraz, de Floresta e José Rodrigues, da Serra Negra (Tacaratu) - organizaram uma tropa e saíram no encalço de Frazão. Sabendo que ele às vezes aparecia em Custódia procurando José Joaquim, ali chegaram alta noite e, enquanto Barbosa e José Rodrigues ficavam descansando, a uns 200 metros da povoação, o coronel Serafim põe cerco à casa de José Joaquim. Bate-lhe à porta. Ele levanta-se, envolve-se num capote, segura uma garrucha de dois canos e, aparecendo à porta, pergunta de que se trata. Serafim lhe diz que procura Frazão, que esperava encontrar-se em sua casa. Aí o velho sai para o terreiro, esbraveja, diz desaforos como o diabo, até que Serafim, danado da vida, retira-se com a tropa e vai comunicar aos companheiros o ocorrido. “E por que não o prendeu?”, disseram-lhe os outros. “Vão vocês prendê-lo”, respondeu ele, “mas preparem-se para morrer ou para matar! Pois o velho é uma cascavel, e eu não quis fazer com ele o que se faz com as cobras” ...
Realizou-se um baile, à noite, decorrendo a festa na maior animação e perfeita harmonia.
Incidente interessante ocorreu naquele dia: um menino da ala dos conservadores, ao atravessar a rua, sentindo-se insultado por ter sido chamado de “guabiru” por outros do partido contrário, e, exaltando-se, bradou, batendo nos peitos, que era guabiru até morrer! Riram-se os presentes, o fato foi largamente comentado, e dali por diante ele não se libertaria mais do apelido... E ainda hoje existe a família Guabiru, descendentes do pequeno conservador daquela época.
Crônica extraída do livro MOXOTÓ BRABO, de Ulysses Lins de Albuquerque. 1970. Ulysses Lins nasceu no ano de 1889 em Alagoa de Baixo, que nos anos trinta mudou de nome para Sertânia, por sugestão do autor, e faleceu no Rio de Janeiro em 1979 aos 90 anos. É autor ainda dos livros: Um Sertanejo e o Sertão e Três Ribeiras. Memorialista, foi político e pai do governador de Pernambuco Etelvino Lins de Albuquerque.
(*) Colaboração de Jorge Remígio.
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