Biografia do Mestre Lunga

Papai

Esta é a história de um homem que viveu para o trabalho, para a família e que tinha um amor imenso por Custódia. Esse amor teve início lá nos anos de 1938, quando a nossa Custódia era uma adolescente pacata e que se vestia de “verdes campos, onde tinha igrejas para rezar”. 

Vicente Eduardo Simões

Nascido em 21/01/1921, no município de Afogados da Ingazeira. Católico, profissão: carpinteiro, apelido: Mestre Lunga. Filho de Manoel Eduardo Simões/Joana Maria de Freitas. Casado com Lindalva Pinto Simões. Teve catorze filhos, dezessete netos, nove bisnetos. 

O dicionário informa que a palavra “Mestre” é atribuída a alguém dotado de especial competência, talento em qualquer ciência ou arte. O uso do apelido Mestre Lunga realçou o homem simples, honesto e sereno, porém dotado de dons e sabedoria. Sua profissão era carpinteiro, ou o artesão que aparelha a madeira e a monta em diversas construções. Usou as suas ferramentas de trabalho sem jamais descartá-las pela sua significância. Quando usava serrote, ele lembrava que na vida é preciso aparar as arestas. O martelo, com as suas repetidas batidas na cabeça do prego, lhe chamava a reflexão do persistir e nunca desistir. Quanto ao formão, que dá forma à madeira, ele dizia: que assim é a vida; se ajeita aqui e muda-se ali e que no final as coisas se encaixam em seu devido lugar. Do compasso, instrumento com que se descreve curvas e ângulos, ele dizia que é preciso comedir, moderar para se chegar às curvas da vida. A plaina e a lixa, quando ele usava essas duas ferramentas, fazia referência também à vida. Nós temos que suavizar nossos dias para a caminhada ser mais leve.

Na sua infância, não teve o privilégio que a maioria das crianças têm: a fase lúdica. Essa fase do brincar e viver como criança. Assumiu muito pequeno a responsabilidade de ajudar seu pai nas tarefas da oficina. Seus pais tinham uma numerosa família de onze filhos: ele, Vicente Eduardo Simões, Oscarina Simões de Oliveira, Quitéria Simões de Freitas, Zulmira Simões de Freitas, Leopoldo Simões de Freitas, Jaime Simões de Freitas. José Simões de Freitas, Sebastião Simões de Freitas, Emanuel Simões de Freitas. Alcides Simões de Freitas e Anízia Simões de Freitas. Sendo ele o mais velho dos irmãos, lhe coube o compromisso de ajudar a criá-los. O trabalho era de jornada integral. Ele se desdobrava como podia, ora fazendo cangas de boi e outras peças de madeira encomendadas ou nas tarefas de casa, ajudando a mãe nas muitas atividades caseiras. Carregava água em galão de água, moía milho na máquina, cortava lenha para o fogão à lenha. Não lhe sobrava tempo para os estudos. Ele tentou, fez a experiência de uma semana e não voltou mais para a escola. O cansaço era bem maior do que a vontade de estudar. Deus foi generoso com ele, dando-lhe uma inteligência extraordinária. Autodidata, conseguia ler, escrever e contar sozinho. Fazia as quatro operações matemáticas com muita precisão. 

Ainda na adolescência, nos seus dezessete anos, seu pai toma uma decisão de deixar o Pajeú pela falta de emprego naquele lugar, em virtude da seca que acometia toda a região. Houve resistência da parte da sua mãe, mas logo passou. Nosso avô começou a procurar emprego e nessa procura soube que em Custódia havia uma promissora Usina de Tanino e que estava precisando de mão de obra. Decidido! Viriam morar em Custódia. Viagem perigosa e penosa. Crianças em cima de carro de boi e adultos em lombos de burros. As crianças choravam de cansaço e os adultos angustiados e impacientes. Enfim, chegam ao município de Custódia, que os acolheu como filhos do coração. A Rua da Várzea, João Veríssimo, foi o ponto de apoio para toda família e o pai da nossa mãe, Floriano Pinto, primo do empresário José Estrela, gerente geral da Usina de Tanino, apresentou-lhes os recém-chegados e logo foram acomodados. A Usina de Tanino ficava na Várzea, onde hoje está o atual Mercado Público. 

O tanino é uma substância química do grupo de fenóis vegetais, elemento encontrado em sementes, cascas e caules. Nosso pai e nosso avô faziam as barricas para o transporte do tanino, que era levado pelo Sr. Cirilo Virgínio de Almeida, pai de meu esposo Arnaldo, que morava em Salgueiro e passava por aqui para transportar os produtos até a estação de trem em Sertânia. De lá, ia para Recife e era então exportado em navios para a Alemanha. As barricas eram tão bem feitas que não vazavam. O material usado na confecção das barricas era madeira e ferro que as circundavam.

Mamãe

Casamento de nossos pais


Nosso pai se apaixonou pela moça mais bonita da Rua da Várzea, filha de Floriano Pinto e Regina Olímpio, que correspondeu ao rapaz de estatura média, loiro, de olhos azuis e inteligente. Namoraram, noivaram e casaram como manda a Santa Igreja. Dessa bela união, tiveram catorze filhos, cinco falecidos quando pequenos. Os nove que sobreviveram são: Linalva Pinto Simões Rodrigues, Floriano Pinto Simões, Lindinalva Pinto Simões de Almeida, Lucidalva Pinto Simões, Luciene Pinto Simões Izidro, Lélia Maria Pinto Simões, Leonildo Pinto Simões, Leônia Pinto Simões Leite e Hugo Vicente Pinto Simões. 

Filhos de Mestre Lunga

Suas amizades eram verdadeiras. Adamastor Ferraz, seu cunhado, casado com sua irmã Oscarina Simões de Oliveira era seu amigo de todas as horas. 

Ele montou sua própria carpintaria. Muito criativo, fazia móveis perfeitos: guarda-roupas, camas, cristaleiras, mesas, enfim, ele agregou outras profissões ao seu currículo: vendedor, pedreiro, chaveiro, torneiro mecânico e soldador. Tudo que lhe era dado para fazer, realizava com perfeição. Essa oficina ficava no primeiro cômodo do grande chalé de propriedade de Dona Nita, onde é o começo de uma das origens de Custódia.

Algum tempo depois, transferiu a carpintaria para um local vizinho a nossa casa. Nesse meio tempo, foi convidado por seu compadre e amigo Domingos Alves de Gois para trabalhar na Casa Gois, que era gerida pelo próprio Sr. Domingos e seu irmão Sebastião Gois. Nosso pai fazia móveis para vender nesse estabelecimento comercial. E nas segundas-feiras, trabalhava também como vendedor dessa loja, das 08:00 às 17:00. O dia era curto para tantas atividades. 

Os três filhos homens de nosso pai aprenderam seu ofício, uns mais e outros menos. Floriano, o mais velho (Nano), quando pequeno, já fazia carrinhos de brinquedo de madeira tão perfeitos que parecia que havia sido seu mestre quem construiu. Na mecânica, era um perito. Leonildo fazia alguma coisa de madeira também e era levado e esperto. Não demorava muito na oficina. Contudo, vendia os móveis e era o empreendedor da família. Hugo, por sua vez, e a exemplo do nosso pai, é autodidata e tem todos os dons do nosso pai. Pequenino ainda, montado num pau de vassoura, dizia que aquilo era seu cavalo corredor. Papai, observando, disse: “meu filho, me dê seu cavalo aqui”. Hugo o entregou e papai, num piscar de olhos, esculpiu a cara de um cavalo no pau de vassoura. A felicidade foi total. Certa vez, Hugo brincando com um violão de brinquedo, nosso pai vendo seu talento musical, disse que ia fazer um violão para ele. Foi com essa miniatura de violão que ele aprendeu a tocar sozinho. 

O mestre Lunga trabalhou por vários anos na Fábrica de Doces Tambaú, fazendo caixotes para transporte de seus produtos. Por onde passou, deixou seu suor derramado e seu trabalho que marcou a história de um homem que se preocupava com a terra escolhida para viver, verdadeiramente amada por ele, tendo participado, enfim, de sua construção através dos tempos. A nossa mãe, querendo sempre ajudar, pediu a nosso pai que fizesse uma máquina de algodão doce para ela. Com o lucro dessa máquina, ajudou nas despesas do lar.

No final da década de 1970, investiu na primeira funerária do município de Custódia, que ficava na Rua José Estrela, por trás de nossa casa. Grande parte dos caixões de adultos e infantis, ele mesmo fabricava. A qualidade era a mesma de caixões de fábrica e as urnas eram compradas nas grandes fábricas do Sul e Sudeste, atendendo também às cidades circunvizinhas.

Nós, seus filhos, seguimos sua indicação: suas filhas serem professoras (exceto Lélia, que é técnica contábil) e seus filhos, o seu legado, expresso no testamento que nos deixou. O mais rico tesouro deixado por um pai que verdadeiramente ama um filho. Esse testamento não tem ouro nem prata; tem tão somente bens invioláveis do homem todo, uma vez adquiridos ninguém rouba.

Netos e bisnetos do mestre Lunga e Lindalva:

Filhos de Flávio e Linalva:


Plínio Fabrício: técnico contábil, artista plástico, cenógrafo, músico, compositor, cantor e comerciante.


Priscilla Fabiana: bacharela em ciências contábeis.


Drª. Polyne Rodrigues: psicóloga.

Filhos de Floriano e Neide / Albaniza:


Annaflora: bacharela em contabilidade; Leiliane Simões: professora e Jailson Simões: engenheiro civil (segundo casamento).

Filhos de Arnaldo e Lindinalva:


José Gleisson: contabilista.


Drº. João Paulo: advogado.


Janielle Maria: bióloga.

Filho de Lucidalva:


Vicente José Laamon: engenheiro agrônomo, mestre e doutorando.

Filhos de Venâncio e Luciene:


José Lypson: zootecnista, mestre e doutorando.


Rochelly: estudante.

Filhos de Hugo e Josete:


José Higor: bacharelando em biologia.


Layza Maria: bacharelanda em fisioterapia.

Filhas de Valmir e Leônia:


Maria Eduarda: estudante.


Maria Victória: estudante.

Bisnetos:

Filhos de Plínio e Adriana:


João Pedro: estudante; Fabrícia Leonara: bacharelanda em odontologia e Victória Lorrany: licenciatura em letras.


Filhos de José Henrique e Annaflora:


Gabriel Vieira Simões Vieitez: estudante.


Rafael Vieira Simões Vieitez: estudante.

Filhos de Gleisson:


Pedro José: estudante (primeiro casamento), José Arthur: estudante e José Heitor: estudante (filhos de Gleisson e Ilka Paula).

Filha de Janielle:


Maria Júlia: estudante.

Filho de Lypson e Natalhia:


Teodoro José.

“Basta ao discípulo ser como seu mestre, e ao servo como seu senhor”.

Custódia, 30 de junho de 2020.

Sua filha,

Lindinalva (Nenê).

Créditos:

Fatos narrados: Meus irmãos, irmãs e eu.

Fotos: Perfil do Facebook de Adriana, meus sobrinhos, sobrinhas e fotos de meus arquivos.


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3 Comentários

Unknown disse…
Parabéns minha irmã pelo excelente relato da história do nosso pai mestre Lunga, e da nossa família.Parabéns também a Paulo pela iniciativa dessa homenagem e desse blog que divulga e conta para posteridade que Custódia teve grandes homens e mulheres.
Annaflora disse…
Maravilhosa a biografia no meu amado avô!!!
Leônia. disse…
Cheia de saudades desse tempo que ficou na memória e agora registrado por você. Confesso que, não pude controlar as lágrimas, chorei muito...Um filme foi passando em minha cabeça e pude sentir a mesma emoção de quando vivíamos debaixo das "asas dele e de mamãe."

Ao ler a biografia de papai, uma alegria invadiu o meu coração por ser filha de um homem como o "Mestre Lunga" de Custódia. Diferente daquele que ganhou fama pela aridez
de suas respostas, o nosso "Lunga" era manso e humilde de coração.

Nenê, você sabe o quanto lhe admiro e como seus ensinamentos de" irmã/mãe" foram importantes na minha formação e dos nossos irmãos mais novos. Minha gratidão por tudo.

A história do nosso querido e inesquecível pai, com certeza muito nos orgulha. Além disso, servirá de exemplo para a atual geração "Pinto Simões"e as que estão por vir.

Parabéns, minha irmã.
Te amo muitooo.

Leônia Pinto Simões
onisimoes@hotmail.com