Nós e os Violados - por Carlos Lopes



Carlos Lopes
Recife-PE
Junho/2013

Naquela primavera de 1979 os dias eram iguais aos anteriores e muito parecidos aos tantos das outras estações do ano. Além dos ensaios com a banda marcial do Colégio Padre Leão, por conta do 11 de setembro, só nos restava fazer circular um jornal cujo batismo era ¨O Grito¨.

Este apesar do bom conteúdo e dos ótimos colaboradores o taxaram de ser ¨meio¨didático.

Em meio aos festejos do aniversário do município constava na programação um show do então badalado Quinteto Violado. O conjunto instrumental que se caracterizou pela interpretação de músicas nordestinas seria uma atração e tanto a um lugar carente de entretimentos. 

O grupo musical atravessava o seu melhor momento, inclusive com reconhecimento a nível nacional. Na própria casa de disco local havia a disponibilidade do primeiro disco e dos álbuns mais recentes Antologia do baião (1977), Missa do vaqueiro (1976 e Até a Amazônia (1978). 

Afinal, Gilberto Gil havia definido o grupo como ¨free nordestino¨ e Caetano Veloso afirmou textualmente ser a novidade na música brasileira.

Pela manhã com Fernando José formulamos as perguntas a serem feitas ao Quinteto e a abordagem ficou definida acontecer no cair da tarde. Um pouco antes do horário previsto chego à casa do amigo, em pânico. Concordamos da necessidade do apoio de alguém a altura daquela tarefa. 

A tarde caia quando eu, Antônio Remígio, Fernando José e o colaborador do ¨Grito¨ Peter Peterson(Dr. Pedro Pereira) chegamos ao hotel Macambira. Minutos depois Marcelo Melo estava diante de nós. O salão de janta estava vazio e por mais de uma hora desfrutamos também da companhia de Toinho, Fernando, Luciano e Ciano que chegaram aos poucos.

A apresentação do grupo se deu no oitão da igreja e depois fui pra casa transcrever a entrevista, na maior ansiedade de fechar a edição. Dois dias depois estávamos fazendo a impressão quando faltou tinta no mimeógrafo. 

Busquei o produto na prefeitura e antes que a matriz, em papel chamado estêncil, danificasse peguei o carro lá de casa e fui ao DNOCS conseguir a tal tinta. Logo depois da Pindoba me deparei com uma patrulha rodoviária. ¨O senhor sabe a que velocidade estava?¨ ¨Uns 80km, acho¨. 

Depois de saber ter passado dos 120km, o guarda pediu a habilitação. Evidentemente, eu não tinha. Então solicitou descer do veículo. Respondi: ¨O senhor multe no que for preciso, pois não tenho tempo pra conversas¨. Pisei até o fundo do acelerador!

O escritório ficava junto à rodovia e como conhecia o pessoal em minutos tinha a bisnaga na mão. Era uma reta e os guardas avistaram o Chevette sendo manobrado. Um deles praticamente ficou no meio da pista fazendo sinal para que eu parasse. Passei a uns 140km sem nem olhar pra trás. 

Meu pensamento: ¨Até eles me alcançarem eu já estou dentro da cidade e lá não tem jurisdição¨. Não foi uma hora e meu pai já sabia do ocorrido. O prefeito foi lá e conseguiu cancelar as quatro multas aplicadas, entre elas, desacato a autoridade.

No dia seguinte passamos à tarde na Praça Padre Leão vendendo jornal cujo grito de misericórdia era: ¨Estudantes de Custódia perguntam ao Quinteto Violado¨. Foi uma festa! Uns comprava pela entrevista, outros pela vontade de contribuir e havia também os que evitam a rotulação de anticultural. 

Era o tempo em que quem sabia tinha o gosto de repassar a informação. Quem transitasse de carro ou a pé, não escapava dos apelos meio desesperados. Afinal eu, Fátima Ferreira, José Assis e José Eugênio rodamos exemplares aos montes. 

No cair da tarde, restavam apenas uns trinta. Sobra, nem pensar! Fomos de porta em porta até liquidar a fatura. Exaustos, olhamos um pro outro, com a sensação dever cumprido. Todos queriam comida e cama. 

¨Desta vez ninguém taxa o jornal de didático¨, disse-lhes. ¨É cultura e informação¨, acrescentei. Nada em contrário. Então cada um seguiu em busca do seu lar. Afinal, não é todo dia que se tem a oportunidade de entrevistar o Quinteto Violado.

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